Por Beatriz Camargo, 24/ 01/2020.
A Umbanda é uma religião muito comentada, mas ainda pouco compreendida pelos que não a seguem. O nome Umbanda surgiu em 15 de novembro de 1908, em um centro Kardecista em Niterói (RJ), por meio do Médium Zélio Fernandino de Morais, que incorporou o espírito do Caboclo das Sete Encruzilhadas. O Caboclo anunciou, através de Zélio, que se iniciava no plano espiritual um novo movimento chamado Umbanda. A religião, então, ao contrário do que muitos imaginam é de origem brasileira.
Depois da manifestação do Caboclo, ocorreu a de um Preto Velho, Pai Antonio. Ambos falavam de maneira informal, sem termos complexos e essas características não agradaram os centros Kardecistas. Mesmo que, aparentemente, o plano espiritual quisesse esta aproximação, a Umbanda teve de procurar outro local para se consolidar.
O Candomblé acolheu a Umbanda em seus terreiros, então, e esse foi o início da religião. Até hoje muitas pessoas confundem as duas doutrinas, mas que são bastante diferentes. A doutrina Umbandista não é rígida em suas celebrações, cada centro possui seus próprios ritos e o fiel pode procurar o que mais lhe representa. Quando as sessões têm características mais marcadas pelo Candomblé, chama-se Umbanda Cruzada; quando mais próxima do Kardecismo, chama-se Umbanda Original.
Como a Umbanda compreende a morte
Para a Umbanda não existem os opostos, como Paraíso e Inferno, Bem e Mal, já que tudo é um momento e a natureza seria o equilíbrio, onde nada se perde, mas se transforma, semelhante ao ciclo de Lavoisier, como explica Marcos Peixoto, presidente há 10 anos do Centro Espiritualista Irmãos de Fé (CEIF), localizado em Grajaú (RJ).
A religião crê que existam várias encarnações após a morte, para a constante evolução do espírito, como comenta o presidente. “O momento de morte é o momento em que o espírito se desprende do corpo, retorna a sua origem, mas a evolução do espírito continua, tanto no plano espiritual, quanto no retorno ao plano físico”. Mas Peixoto ressalva que o encarne não é a única vivência do espírito, já que o outro plano é um desdobramento desse, ou seja, existem escolas, hospitais, delegacias e cada espírito sabe o que deve fazer. No plano espiritual, os espíritos têm consciência das pessoas que passaram por suas vidas e as reconhece, essa consciência não viria para o momento do encarne, para que ele pudesse ter novas oportunidades, com decisões livres de traumas e experiências do passado.
Quando encarnado, as ações guiarão o tamanho da evolução do espírito. Isso influenciará nas outras vidas e no período em que ele ficará no plano espiritual. Os Orixás, termo herdado do Candomblé, são as forças puras da natureza, agem como guardiões que auxiliam e regem a bagagem que cada um leva durante a caminhada.
A morte, apesar de ser um momento muito difícil para quem fica, é uma libertação das limitações corpóreas para o espírito, como complementa o presidente. “Na nossa cultura atual, choramos pelo luto, pela passagem, temos um conceito de que a morte é ruim, quando na realidade, com a nossa leitura espiritual, ela não é, mas sim uma libertação, o fim de um ciclo e o recomeço de outro”.
Quando um fiel passa pelo momento de luto, a Umbanda lhes ampara com ações específicas, como explica Peixoto. “A questão do luto é acolhida nas sessões de atendimento, nas conversas com as entidades, Pretos Velhos, Caboclos, Crianças e também com os Exús e Pombagiras, chamados por nós, Guardiões. Esses espíritos de Luz são a linha de frente, os representantes em terra, da força pura da natureza. Durante essas consultas o luto vai sendo tratado”. Porém, em casos mais graves, quando este método não funciona, é realizado o segundo grau de trabalho, como reforça Peixoto. “Temos o segundo grau de trabalho, chamado ‘tratamento de processo obsessivo’. Sabemos que as relações de vida e de morte às vezes criam laços, muitas vezes, conflituosos e os espíritos ficam atados por essas energias. Esse processo de luto não é somente para quem fica, mas também para quem vai e às vezes é necessária uma força maior para a libertação desses laços”.
As entidades ajudam os devotos também em vários outros momentos da vida, é comum fazer-lhes oferendas em locais públicos. Marcos Peixoto explica que essa tradição foi herdada do Candomblé. O Presidente do CEIF, contudo, contesta e complementa que se deve refletir profundamente quanto à necessidade e o que irá ser deixado numa oferenda, pois muitos exageram, colocam coisas que poluem a Natureza, sujam as ruas e podem trazer sérios riscos às outras pessoas, o que vai diretamente contra ao fundamento da religião. “Oferendas que nenhum Orixá gostaria de receber”, finaliza.
*Todas as informações foram cedidas por Marcos Peixoto, Presidente do Centro Espiritualista Irmãos de Fé (CEIF), em Grajáu, no estado do Rio de Janeiro. Frequentador da casa desde o ano 2000 e presidente desde 2012, a espiritualidade sempre esteve presente na vida de Peixoto, por grande influência de seu pai.
Marcos Peixoto frequentou por quatro anos o curso para aprender a doutrina Umbandista, na capital paulista. O Presidente explica que não é cobrada nenhuma doação dos devotos e que todos os custos da sede do centro, conquistada após longos anos de economia, são pagos pelos médiuns.
*Fotos: Acervo Pessoal/CEIF.